Francisco, um papa eleito com a missão de salvar a Igreja

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O papa Francisco, com sua linguagem e gestos espontâneos, que desconcerta tanto conservadores quanto progressistas, gerou, em apenas nove meses à frente do Vaticano, expectativas de renovação para uma Igreja atingida por escândalos e mergulhada numa das piores crises de sua história.

O ex-arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, se converteu em março no primeiro Papa latino-americano e primeiro jesuíta a assumir o Trono de São Pedro, em substituição ao austero Papa alemão Joseph Ratzinger, Bento XVI, que renunciou ao cargo em uma decisão inédita em sete séculos.

Uma "perestroika" na Igreja

O novo pontífice escolheu o nome de Francisco em referência a São Francisco de Assis, o padroeiro dos pobres, e anunciou reformas que muitos comparam à "perestroika" (reestruturação) com que o último líder da União Soviética, Mikhail Gorbachov, tentou revitalizar e salvar o socialismo nos anos 80.

"Sim, eu diria que essas categorias podem ser usadas: perestroika e glasnot (transparência); é o que Francisco tenta aplicar", afirmou, em conversa com a AFP, o teólogo italiano Vito Mancuso, docente de História das Doutrinas Teológicas.

A experiência fracassou na União Soviética, mas, segundo o estudioso, poderá ser bem sucedido em uma instituição sólida como a Igreja católica.

As novas orientações se reflete mais na transformação do modo de inserção da milenar instituição no mundo do que em medidas administrativas: menos presença na política, total sobriedade, renúncia a todo tipo de luxos, transparência na comunicação e, principalmente, na atenção ao pobres, aos doentes, às pessoas necessitadas, aos desamparados e aos relegados.

"Creio que é um Papa que faz com atos que gestos. Prega como exemplo", afirmou à AFP a jornalista argentina Elisabetta Piqué, autora de "Francisco, Vida e Revolução", um livro que conta os primeiros meses de um pontificado marcado por suas mensagens diretas e simples.

"Para mim, esses primeiros meses marcam uma revolução", afirma Piqué, que cobre há vários anos o Vaticano.

A mensagem parece ter chegado ao coração dos fieis.

A popularidade de Francisco, o entusiasmo que causa entre los católicos, gerou "uma nova primavera para a Igreja católica", segundo Mancuso.

Mas, como em toda primavera, "os frutos ainda não podem ser colhidos", adverte.

Francisco deve ainda apresentar resultados

Francisco foi eleito a "Personalidade do Ano" pela revista Time, que ressalta sua capacidade de levar às ruas a mensagem do Papado, e pela revista The Advocate, uma histórica publicação americana dedicada à comunidade homossexual.

Para The Advocate, Francisco deu "o sinal de que não é como o antigo Papa", ao declarar em junho passado: "Se uma pessoa é gay, busca por Deus e tem uma boa vontade, quem sou eu para julgá-la?".

Mas as palavras e os gestos devem ser transformados em mudanças concretas.

Para reformar a desacreditada Cúria Romana (administração central da Santa Sé), nomeou uma inédita comissão de oito cardeais, que devem entregar a ele suas recomendações.

A limpeza das controvertidas finanças vaticanas, principalmente do chamado "Banco de Deus", ou seja, o Instituto para as Obras de Religião (IOR), acaba de começar.

"As comissões referentes estão trabalhando bem. Vamos por um bom caminho. Sobre o futuro do IOR, veremos", admitiu, na semana passada, o Papa em uma entrevista ao jornal italiano La Stampa.

Batalhas em todas as frentes

As batalhas acontecem em todas as frentes: moral, social, econômica e até teológica.

No início de dezembro, Francisco criou uma comissão para ajudar as vítimas de padres pedófilos e evitar novos casos, depois dos escândalos que sacudiram a Igreja nos Estados Unidos, América Latina e Europa.

Sua defesa dos imigrantes ilegais, que atravessam o Mediterrâneo arriscando a vida, assim como a firmeza de seu chamado pela paz na Síria, quando parecia iminente um ataque americano, fora classificados como verdadeiros golpes midiático.

O "efeito Francisco" também alimenta fortes expectativas entre quem espera mudanças na recusa da hierarquia eclesiástica do divórcio, controle de natalidade, casamento homossexual, eutanásia, ordenação de mulheres...

"O Papa pode renovar a Igreja, mas não pode inventar uma nova Igreja", advertiu o cardeal alemão Walter Kasper, um de seus maiores admiradores, ao prevenir que muitos podem acabar decepcionados.

A ausência de confrontação, de condenações lançadas do Trono de Pedro, o espírito de diálogo, os chamados de fraternidade, misericórdia e bondade não implicam necessariamente que a Igreja vá mudar sua doutrina.

Para vários especialistas em assuntos vaticanos, os próximos dois anosserão fundamentais para descobrir o verdadeiro rosto que Francisco quer dar à Igreja e a seu pontificado.
AFP

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