Como evitar o inferno na terra

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Por Gianfranco Ravasi 
Houve um período nas últimas décadas em que se multiplicaram os congressos, os encontros, até mesmo os cursos sobre "ética e economia (ou finanças)" ou sobre "ética e política". Os resultados estão diante dos olhos de todos e certamente não são exaltantes, consideradas as causas e os efeitos perversos da crise econômica e política em que estamos afundados. Por isso, seríamos tentados a compartilhar a amarga conclusão do Marco Polo de Cidades Invisíveis, de Calvino, que responde assim a Kublai Khan: "O inferno não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno em que habitamos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem dois modos para não sofrê-lo. O primeiro é fácil para muitos: aceitar o inferno e tornar-se parte dele até o ponto de não vê-lo mais. O segundo é arriscado e exige atenção e aprofundamento contínuos: buscar e saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e fazê-lo durar e dar-lhe espaço".

É um pouco sobre essa segunda escolha que se deve atestar o compromisso social cristão: conscientes do limite e do pecado da criatura, devemos ampliar na história, porém, o espaço do Reino de Deus, ou seja, o horizonte da justiça e do amor. O eixo principal da proposta cristã é claro: "Como opção fundamental que impõe uma orientação essencial da atividade humana, a caridade precisa se encarnar na justiça, sem ter, por isso, que se identificar totalmente com ela (ou esgotar-se nela)". Quem define essa asserção é um teólogo moral de grande refinamento intelectual e de intensa atenção ao complexo panorama contemporâneo, Giannino Piana, ex-professor das universidades de Urbino e de Turim, que agora – depois de um livro dedicado à moral fundamental, já assinalado por nós – continua o seu projeto global, previsto para quatro tomos, com um amplo afresco temático justamente sobre "moral socioeconômica e política".

A própria enunciação do assunto revela a sua amplitude e a delicadeza, e até mesmo um único olhar lançado sobre o índice do texto é suficiente para dar uma sensação de vertigem. Tentemos apenas formular uma lista das questões que se agregam em cacho sobre os três troncos que sustentam a estrutura da obra de Piana.

Entre parênteses, a longa militância acadêmica permite ao autor o uso de um procedimento claramente didático, que, no entanto, evita o pedantismo através de um ditado incisivo e atraente. É por isso que nos permitimos sugerir a leitura, mesmo para quem não está familiarizado com a ética teológica, mas está consciente da necessidade de um olhar não meramente sociológico e fenomênico sobre uma realidade tão ardente e "humana".

O primeiro tronco argumentativo é central e imprescindível, o dos fundamentos. É precisamente aqui que se revelam mancas ou edificadas sobre a areia certas análises desavisadas de uma antropologia de base, indiferentes a princípios constitutivos, alérgicas a fontes que precedem e justificam o fluxo disperso da história. Para um autêntico humanismo cristão, as duas estrelas de referência são o princípio da destinação universal dos bens e a opção preferencial pelos pobres, dois critérios que são a flexão concreta do já mencionado eixo da caridade-justiça.

O segundo tronco do escrito de Piana é mais recente no seu crescimento, mas tem uma alma antiga. Alimenta-se, de fato, com a seiva da atual globalização, que imprime uma nova fisionomia aos dois cânones econômicos clássicos da eficiência e da solidariedade. Aqui, os fundamentos acima mencionados devem se confrontar com as ramificadas dinâmicas e leis do "econômico": nesse âmbito, o autor revela um extraordinário equilíbrio entre capacidade analítica e habilidade sintética.

Basta pensar apenas na sequência das questões que se encadeiam, mas que devem ser postas nas caixas corretas de uma investigação destinadas a desembocar em um crivo rigoroso: a superação da perspectiva individualista na adoção de uma concepção personalista, o equilíbrio entre subsidiariedade e solidariedade, o contraponto entre globalidade e identidade local, a dialética entre Estado e mercado, e a relativa configuração de uma "economia civil" ou de uma "democracia econômica" em que o bem-estar acomode as exigências institucionais com as várias subjetividades sociais. E ainda: a exigência primária do trabalho, direito fundamental da pessoa, o relevo adquirido pela questão ecológica e a radical mudança da comunicação introduzida pelo império midiático, capaz de criar um inédito fenótipo social.

Esse árido elenco permite entender, no entanto, como é grave a superficialidade da política (principalmente italiana), incapaz de inscrever na sua agenda um fluxo tão variado de instâncias estruturais. É assim que o terceiro tronco que sustenta o estudo de Piana se eleva no céu da ética política sobre a qual Cristo já havia se pronunciado de forma lapidar com os seus tuítes de 50 caracteres gregos e respectivos espaços: "Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus" (Marcos 12, 17). Obviamente, esse princípio se desfaz em infinitas e muitas vezes incandescentes aplicações, especialmente em uma sociedade tão articulada e fragmentada como a contemporânea. No entanto, algumas referências estão sempre aí, diante de todos, e impedem de se contentar com uma pura e simples modelística ou com o recurso à seca ou desumana tecnologia sociopolítica.

Pensemos, por exemplo, na pessoa, mas também no bem comum, na reconstrução de uma genuína democracia sustentada pela sociedade civil e não pilotada apenas de cima, na elaboração de uma ordem internacional que não seja uma inerte sociedade das nações reciprocamente em defesa ou em suspeita, na promoção de uma interculturalidade dinâmica capaz de superar a simples multiculturalidade estática; pensemos, enfim, no compromisso com a paz que não seja paradoxalmente confiada apenas à defesa e nem apenas à diplomacia e às intervenções de caráter humanitário, mas que seja positivamente ancorada no desenvolvimento e na integração entre os povos.

O mapa que esboçamos até aqui leva a compreender como é retórico um apelo genérico à ética dos negócios ou da política, e como é necessária uma revisão acurada e um exame pontual das coordenadas tanto concretas quanto valoriais postas em uma interação constante. Escrevia Adorno nos seus Minima moralia: "O conhecimento não tem outra luz a não ser a que emana da redenção sobre o mundo; todo o resto se esgota na reconstrução a posteriori e faz parte da técnica".
Il Sole 24 Ore, 02-02-2014.
*Gianfranco Ravasi é cardeal presidente do Pontifício Conselho para a Cultura.
06/02/2014  |  domtotal.com

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