A mídia está dando uma chance ao papa Francisco?

sábado, 5 de outubro de 2013

Por Eric J. Lyman
A mídia está segurando os seus golpes quando se trata do papa Francisco? Se é porque ele carrega a sua própria mala ou telefona pessoalmente para os católicos em dificuldades que lhe escrevem, ou se é porque ele claramente gosta de interagir com as multidões ou dirige um Renault usado pelo Vaticano, é difícil dizer. Mas, em algum momento, grande parte da mídia do mundo se compadece pelo novo papa.

Agora, um número crescente de infiltrados no Vaticano estão se perguntando se a visão amplamente positiva de Francisco afeta a forma como a mídia cobre a Santa Sé.

Ninguém acusa Francisco de fazer movimentos calculados para receber uma cobertura positiva. Mas o fato é que, a partir de casos relativamente simples, como quando o papa disse a 800 freiras para não serem "solteironas" espirituais, até questões mais sérias como a remoção silenciosa e sem aviso de lideranças da Igreja em casos relacionados ao abuso sexual, há um tom diferente na cobertura midiática sobre o Vaticano do papa.

Em suma, a lua de mel de Francisco faz com que a mídia global se extasie depois da abrupta ruptura da mídia com o seu antecessor, Bento XVI.

"Tome a entrevista que o papa Francisco deu no avião papal em sua viagem de volta do Brasil", disse o cardeal Kurt Koch, chefe do Escritório da Unidade dos Cristãos do Vaticano, referindo-se a quando Francisco perguntou "Quem sou eu para julgar?" sobre a questão de gays e lésbicas. "Isso poderia ter muito bem sido dito pelo Papa Bento XVI. Mas Bento XVI poderia ter sido criticado por diversos meios de comunicação, enquanto o Papa Francisco foi elogiado".

Aqui estão cinco grandes razões pelas quais o jovem papado Francisco é tratado de forma muito diferente do de Bento XVI.

Poucos conheciam o cardeal Jorge Bergoglio antes de ele se tornar Papa Francisco

Isso não é incomum para os papas, mas contrasta com Bento XVI, que, como cardeal Joseph Ratzinger, era uma figura da Igreja de alto perfil. Antes de se tornar papa em 2005, Bento XVI era o antigo prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé – essencialmente o executor doutrinal da Igreja –, o que automaticamente significava que os observadores do Vaticano olhavam para ele com desconfiança.

Em contraste, as poucas histórias sobre Bergoglio antes de ele se tornar papa centravam-se no fato de ele ir de ônibus para o trabalho, rezar missa nas favelas e cozinhar suas próprias refeições, coisas que davam boas manchetes.

A pior cobertura de imprensa que ele recebeu foi quanto ao seu papel na "guerra suja" da Argentina, uma história que rapidamente foi ofuscada por uma foto dele fazendo o check-out do hotel do conclave e fechando a sua conta.

"É muito mais atraente para a maioria das pessoas pensar sobre o humilde trabalho de campo e a experiência pastoral de Bergoglio do que pensar em Ratzinger sentado em algum palácio do século XVI debruçado sobre questões da ortodoxia", disse Robert Mickens, correspondente do Vaticano para a revista católica britânica The Tablet.

Francisco é empático e humilde

É notável que o novo pontífice evita a maior parte da pompa e da ostentação do papado: ele se veste de forma simples e se recusa a viver nos ornamentados apartamentos papais dos seus antecessores. A sua maneira de falar é frequentemente improvisada e fácil de seguir, e ele trata os fiéis como colegas, pedindo suas orações, partilhando eventos sobre o seu passado – e muitas vezes ainda posando para fotos.

Em suas primeiras horas como papa, ele pediu que a multidão na Praça de São Pedro rezasse por ele antes que ele os abençoasse e depois "pulou" a oportunidade de abençoar os meios de comunicação de modo a não ofender os jornalistas não católicos.

"O seu estilo de fala se parece menos a uma lição do que a um diálogo espontâneo", disse Chiara Parenti, coautora do novo livro Papa Francesco. Apertura, dialogo e umiltà. "Ele tem uma empatia sincera pelas pessoas com as quais ele fala, e isso se traduz".

O estilo se torna substância

Em matéria de doutrina, Francisco não é nem de perto tão radical quanto parece à primeira vista. As suas declarações sobre o fato de não julgar os cristãos gays ou de afirmar que a Igreja é "muito obcecada" por questões polêmicas da moral sexual não resultaram em nenhuma mudança na doutrina da Igreja. Mas a forma como ele falou sobre isso lhe rendeu muitos fãs.

"A maioria das lideranças da Igreja buscam ensinar quando falam, mas Francisco tem uma forma de falar que abraça as pessoas primeiro, antes de ensinar", disse Paolo Rodari, o correspondente vaticano para o jornal La Repubblica, um dos principais jornais da Itália.

Isso pode parecer uma questão de estilo superficial. Mas, com o tempo, um estilo convincente pode mudar as percepções. E, na Igreja assim como na política, a percepção impacta a realidade.

Embora ninguém discutiria que o tom do Vaticano não mudou com Francisco, algumas regras ou políticas mudaram. E, mesmo assim, uma esmagadora maioria das pessoas dizem ver uma nova direção a partir do Vaticano II: a empresa de pesquisa Opinioni, de Roma, disse na semana passada que três em cada quatro italianos gostaram da direção que a Igreja está tomando em comparação com os menos de 45% do ano passado. Uma pesquisa com os católicos norte-americanos feita pelo YouGov/HuffPost divulgada esta semana mostrou que mais de quatro em cada cinco entrevistados pensam que Francisco teve um efeito positivo sobre a Igreja.

"Claramente, a maioria das pessoas acreditam que a Igreja virou uma página, e, se elas acreditam nisso, então metade da batalha está vencida", disse Maria Rossi, codiretora da Opinioni.

Ele pratica o que prega

A maioria das lideranças religiosas falam sobre a necessidade de ajudar os pobres, mas Francisco vive essa mensagem com gosto: em uma recente viagem à Sardenha, ele se encontrou com jovens desempregados e lhes contou sobre as dificuldades econômicas da sua própria família depois de emigrar da Itália para a Argentina, e depois compartilhou uma refeição com alguns dos moradores mais pobres da ilha.

Esse é um papa, afinal, que disse aos seus bispos para serem pastores "que tenham cheiro de ovelhas".

"Eu acho que seria difícil para alguém que não conhecesse quem era Francisco reconhecê-lo como papa com base nas coisas que ele diz e faz", disse Alistair Sear, historiador da Igreja aposentado.

Mickens concordou: "Às vezes, você lia sobre o fato de que o Papa Bento XVI estava fazendo uma viagem para algum lugar durante quatro dias, e 10 das suas 12 refeições ele fazia sozinho ou com o seu secretário pessoal", disse. "Mas Francisco adora estar com as pessoas".

Francisco não é Bento

Isso não poderia ser mais óbvio, mas Francisco tem uma espécie de credibilidade que Bento XVI nunca teve: o histórico, a empatia e o estilo de Francisco permitem que ele se lance como um defensor dos pobres e destituídos de uma forma que pareceria forçada ou talvez insincera vindo de Bento XVI, que se vestia ricamente e falava da sacada do seu luxuoso apartamento vaticano.

Isso permite que Francisco se comunique de uma forma que seria possível para o seu antecessor. Em uma audiência geral no início deste mês, Francisco comparou a Igreja às mães: "Todas as mães têm defeitos", disse o papa. "Mas, quando falamos dos defeitos da nossa mãe, nós os encobrimos – nós a amamos assim".

Mickens riu ao falar sobre isso: "Se o Papa Bento XVI alguma vez pronunciasse as palavras ´encobrir´ e ´Igreja´ na mesma frase, você pode imaginar a gritaria!", disse.
Religion News Service, 01-10-2013.

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